Há muito tempo, numa época de que ninguém se lembra, dois jovens apaixonaram-se por estas partes. Mas era um amor impossível, porque pertenciam a tribos diferentes e a sua união nunca seria permitido pelas respectivas famílias.
Desesperados pela ausência de futuro para a sua relação, ele e ela começaram a chorar. E de tal forma verteram lágrimas que estas escorreram e formaram dois lagos. As dele criaram o Isli (que significa, “noivo”) e as dela encheram o Tislit (que, já imaginam, quer dizer “noiva”).
Quando finalmente choraram até não terem mais lágrimas para verter, acabaram com as suas vidas, afogando-se nos lagos. A lenda sublinha que o destino dos jovens foi tão triste que mesmo após a morte se mantêm separados, desta vez não pelas inimizades tribais mas pela montanha que se encontra entre os dois lagos.
Ainda segundo contam os antigos, a tristeza dos jovens contagiou as gentes, de tal forma que as tradições foram alteradas para permitir o casamento de membros de tribos diferentes. Fica assim encontrado um sentido para o sacrifício dos jovens enamorados.
Enfim, é a versão marroquina de uma história clássica, a de um amor impossível entre jovens separados por conflitos moralmente sem sentido. A mais famosa de todas é italiana, mas criada pelo inglês William Shakespeare: Romeu e Julieta. Mas não é a única. De forma mais real e trágica os bósnios tiveram a sua: Bosko e Admira, ele de origem sérvia, ela muçulmana, abatidos a tiro em Sarajevo quando tentavam fugir da cidade no pico da guerra civil de meados dos anos 90.
Sem querer estragar a beleza da lenda, é provável que o que se tenha passado é que numa região com graves problemas demográficos e fraca mobilidade das pessoas, as comunidades sentiram a necessidade de promover o encontro entre pessoas do sexo oposto para encorajar o casamento e a renovação da população. Isto porque o que hoje torna a cidade próxima de Imilchil famosa é o festival de Souk Aamor Agdoud N’Oulmghenni que, por assim dizer, é um festival casamenteiro celebrado pelas tribos Aït Sokham and Aït Bouguemmaz.
Ocorre todos os anos em Setembro, um evento criado para que rapazes e raparigas escolham respectivos parceiros para a vida, de comum acordo. Um piscar de olho, um aceno de cabeça, são sinais de concordância, de sintonia. Os amigos ajudam-se entre si na luta contra a timidez. Dar as mãos é o segundo sinal, mais definitivo, um símbolo de união que indica concordância. Se uma mão for retirada a ideia é rapidamente entendida: não há nada a fazer.
Finalmente, se a mulher disser, “conquistaste o meu fígado”, os seus sentimentos são claros: na cultura berbere é no fígado e não no coração que reside o amor. A partir deste momento as famílias de ambos terão uma reunião para debater os primeiros passos, os primeiros preparativos para o casamento, que será planeado em detalhe mais tarde, na aldeia do noivo.
No passado o festival não estava acessível a estrangeiros. Isso mudou, numa tentativa para desenvolver o turismo numa área tão remota de Marrocos. Mas há quem não concorde, diz-se que o excesso de visitantes está a matar aos poucos o festival.
Mas até lá, continua a ser um espectáculo memorável. Cerca de trinta mil pessoas, que descem das montanhas, com as suas tendas, o seu gado, os seus camelos e montam uma cidade móvel, onde se realizam espectáculos de dança, se estendem mercados. As mulheres vestem as suas mais finas roupas, plenas de cor. Há música, comida e muita alegria.
Quanto aos lagos, foram parecem na realidade ter sido formados na sequência de impactos de meteoritos, como indicam os fragmentos de minério característico encontrados no fundo de ambos os lagos, a sua forma circular, a presença de cristais de quartzo, as formações sedimentárias e outros vestígios geológicos.